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Dólar elevado e incentivos animam setor

Imagem - Dólar elevado e incentivos animam setor

Redução tributária leva 46 empresas a aderir ao Rota 2030

A alta do dólar poderá beneficiar a indústria de autopeças no Brasil. O aumento dos custos para trazer componentes do exterior tende a levar as montadoras a elevar o conteúdo local dos veículos. Mas, para o presidente do Sindipeças, que representa os fabricantes de peças, Dan Ioschpe, esse estímulo não basta se a indústria local não estiver pronta para acompanhar a evolução dos automóveis e produzir aqui itens que hoje a indústria automobilística compra no exterior por não encontrar similar no mercado nacional.

O ambiente desfavorável à importação surge num momento em que esse setor já começou a se preparar, aproveitando incentivos fiscais oferecidos no programa automotivo lançado pelo governo federal no fim de 2018. O chamado Rota 2030 prevê redução no valor do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido para fabricantes de veículos e de autopeças que investirem em pesquisa e desenvolvimento. O benefício pode ser adicionado à Lei do Bem.

Um total de 46 empresas de autopeças inscreveram-se no programa desde que foi lançado, segundo dados do Ministério da Economia. Na lista, há multinacionais, como Dana, Delphi, Valeo, Eaton e a gigante brasileira WEG. Mas há também fabricantes de itens menos sofisticados, mas que precisam evoluir à medida que a tecnologia veicular avança.

A alemã Robert Bosch, maior fabricante de peças do mundo, é uma das que mais investe em itens da parte eletrônica do veículo, tanto sistemas voltados às novas energias, como eletrificação, como “infotainment”, que agrega dispositivos de informação e de entretenimento. Em alguns casos, equipamentos de conectividade ainda são importados.

O presidente do Sindipeças não costuma falar sobre a empresa que a sua família fundou, há mais 100 anos. Mas numa entrevista recente, Marcos de Oliveira, presidente da companhia, a Iochpe-Maxion, relatou diversos projetos de inovações que estão em fase de desenvolvimento, envolvendo incentivos do Rota 2030. Com centros de pesquisa no Brasil e no exterior, a Iochpe tem feito testes com novos materiais, como fibra de carbono e plástico, para reduzir o peso das rodas que produz. Rodas mais leves serão vitais para o bom desempenho dos carros elétricos.

Hoje, em torno de 70% da receita das autopeças é obtida com vendas para montadoras. Desse total, 66% representam itens que vão direto para as linhas de montagem de veículos e 4% são a fatia intrassetorial – venda entre fornecedores, que, de toda forma, segue para montadoras. Por lei, veículos produzidos no Brasil precisam ter mínimo de 60% de conteúdo nacional. Os mais populares alcançam percentuais maiores, em torno 80% e até 90%. Mas os que carregam mais itens eletrônicos têm maior fatia de itens importados.

O projeto do Rota 2030 demorou meses para ser transformado em lei porque sofreu forte resistência de parte do governo. O programa era defendido pelo extinto Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio enquanto a equipe da Fazenda era contra a ideia de conceder mais incentivos à indústria automobilística. No governo de Jair Bolsonaro, que assumiu logo depois que seu antecessor, Michel Temer, assinou o decreto do Rota 2030, as duas pastas foram unidas no atual Ministério da Economia.

Cálculos do governo indicavam a renúncia fiscal de R$ 3,75 bilhões nos dois primeiros anos do programa (do início de 2019 ao fim de 2020) diante perspectiva de, no mesmo período, montadoras e autopeças investirem R$ 5 bilhões em pesquisa e desenvolvimento.

O presidente do Sindipeças diz que se trata de “um incentivo inteligente alinhado com o que há no resto do mundo”. “É um mecanismo não conjuntural, com valores pequenos que dão um retorno rápido”, completa.

Para Ioschpe, com esse benefício, a indústria pode participar dos projetos desde o início. “E não mais correr atrás para adaptar para o Brasil o projeto de um carro desenvolvido na Coreia. Quando isso acontece já estão lançando um novo modelo. Os produtos tem vida útil cada vez menor e se não investirmos aqui a pesquisa vai para outras partes do mundo”, destaca.

Segundo o dirigente, não é necessário desenvolver o veículo completo no Brasil. “Podemos trabalhar no desenvolvimento de alguns conjuntos”, diz. Ele lembra que esse tipo de projeto tem “ilhas de excelência” no mundo. “O problema é não estarmos em nenhuma delas”, completa. Para ele, o Brasil tem que buscar a vocação. “O uso do etanol é uma delas”.

O investimento em pesquisa não consegue, porém, sozinho, diz Ioschpe, garantir competitividade se o país não avançar em questões como reforma tributária e melhoria da infraestrutura. E isso vale também em relação ao câmbio. “Podemos ter uma erosão da benesse da variação cambial pela estrutura de custos”, destaca. Para ele, é difícil prever quando haverá equilíbrio. “A desvalorização da moeda local deveria incentivar a nacionalização, mas isso envolve uma série de outros fatores”.

Segundo Ioschpe, o cenário de hoje é muito melhor do que há quatro anos. A média de ocupação das fábricas do setor que emprega 248 mil pessoas ficou em 70% no segundo semestre de 2019 ante os 45% no pico da crise, em 2016. Antes da nova crise, provocada pelo coronavírus, essa indústria tinha a perspectiva de ter o quarto ano consecutivo de recuperação. “O setor está mais em busca de melhorias de inovação e menos lambendo suas feridas”, diz o dirigente.

A projeção mais recente do Sindipeças indica aumento de 3,1% no faturamento de 2020 (R$ 148,5 bilhões) e de 4% no investimento (R$ 2,1 bilhões). Na entrevista ao Valor, há pouco mais de uma semana, Ioschpe disse que a grande questão era saber o tamanho do impacto da crise na demanda. “Se houver paralisia em regiões como a Europa certamente teremos reflexos em toda a economia”.

Fonte: Valor Econômico

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